sábado, 29 de junho de 2019

Preciso de um tempo

As coisas só são quando são. Só podem existir em um momento no tempo. E por isso, só existem fotos. A vida é um filme de rolo. Uma passagem de fotos em sequência. E só existe uma sequência. As outras sequências, ignoramos.

As coisas necessitam ser no tempo. E por isso, só são precisas no tempo. As coisas em mais de um tempo são como um borrão, quando se tira uma foto de algo em movimento.

Quando pensamos em pessoas, pensamos num ente, que se desenvolve, mas é sempre o mesmo ente. É o mesmo ente porque necessariamente carrega a própria história, sua sequência. Mas isto é a única coisa que o ente carrega entre dois tempos.

Por isso, quando olhamos pra uma pessoa e dizemos: ¡nossa, quanto tempo! Não estamos falando pra pessoa que já conhecíamos, mas pra pessoa que agora está. Quando escutamos sobre uma pessoa histórica, temos de entender quando ela é. Afinal, como Arnaldo Antunes ensina em sua música:
"todo mundo teve infância
Maomé já foi criança
Arquimedes, Buda, Galileu
e também você e eu"

Se você pensa que sabe com quem está falando porque conhece seu passado, não percebe o quanto pode ter mudado. E você também.

domingo, 2 de junho de 2019

Desordem

Tu acredita que existe alguma ordem ou sentido que governa a existência e o devir das coisas, ou que há simplesmente uma deriva, o acaso e o caos que explicam os acontecimentos mais naturais?

E se as coisas apenas existirem? Se não houver qualquer sentido para tudo existir? Apenas aconteceu. O que aconteceu e como aconteceu e é o limite do nosso conhecimento. Afinal, qual o limite da razão de um cérebro de 80 bilhões de células? E do conjunto de mais de 7 bilhões de cérebros de mesmo tipo? É interessante como ter 80 bilhões de células no cérebro não explica a sua natureza. O cérebro, um dos acasos mais impressionantes da natureza não apenas é o que o compõe. A natureza das partículas subatômicas não é suficiente para entender o gosto da água.

Por indução, nem sempre a soma das partes garante todas as propriedades do todo. O todo pode ser algo que excede o sentido do que o compõe. Assim vão se abrindo os fractais do caos que é a natureza.

O mundo não é racional. Não sou descartiana. Não duvido dos sentidos, não concluo que o ser perfeito existe. Imaginar a perfeição e o ser perfeito só demostra o limite da nossa razão, que supõe conceber a perfeição. Sou uma intelectual. Uma cética. Sou atéia. Mas não é possível ser cética o tempo todo.

Só que este lado da linha é vazio. Vazio de sentidos e razões. É como se tivéssemos que criar o sentido a todo o momento, e isso é pesado. É dolorido. Cansa. A sociedade cria os sentidos para manter a coesão, e liberta o pensamento para outras buscas. As pessoas comungam razões e isso é o que garante a coesão das tribos. Não ver sentido é não conseguir criar laços. É ver os laços e não se sentir parte deles. Negar o motivo pode gerar exclusão social. As pessoas que negam os princípios que as sociedades criam são marginalizadas.

Disso, a única coisa que pode salvar é relação da minha consicência com meus sentidos. Preciso mais do que acreditar no que me dizem os sentidos. Preciso senti-los. Preciso deixar a mente sentir. Porque o mundo não é racional. E a mim, na arte, o que não é racional, por vezes, me encanta. O humor que me emociona é o absurdo. É ácido. O lugar comum me cansa. Talvez haja algo de positivo em não fixar os laços. Mesmo com todas estas condições, com frequência encontro pessoas com quem faço laços. Mais do que isso, com quem tenho interesse em fazer laços. Pessoas com quem eu mantenho meus laços.

Preciso de arte para viver. O sentido que podemos criar para nossas vidas é a arte, pois a arte é sentir.


Disclaimer: Esse é apenas um esboço incompleto e desordenado. Como os limites da razão humana.

sábado, 9 de março de 2019

É fogo, amigo

Cabeça abaixada em busca de solução
Apenas quando os tiros vêm
A violência é o domínio da força
A força não anda de trem
Cabeça ao alto e armas na mão
As pedras não param quem
Não tem nada a perder

Temos apenas o dia de hoje
Para mudar o dia de amanhã
Temos apenas o dia de hoje
Para mudar como vivemos
E apenas no dia de hoje
A revolução vale a pena

Vivo sem saber até quando
Ficarei viva de joelhos
Me lamentando as oportunidades perdidas
Mas a revolução não se faz sozinha
E não há pra onde correr

quarta-feira, 23 de janeiro de 2019

Davos

Em uma terra distante
Cercada por águas sujas
Inacessível aos mortais
O monte Olimpo se erguia

O monte fora erguido para deleite dos deuses
Se reuniam periodicamente
Seus afazeres eram decidir
Executar a sangue frio
Mais dores nos humanos aflitos
Que ao pé e ao cabo,
Lhes ofereciam infinitas oferendas

Vez em quando, semi-deuses
Como que pra provar que tinham direito
Aos pequenos poderes concedidos
Depois de conseguirem subir a humanamente inacessível montanha
Voltavam para a terra e para os infernos
Com 12 missões incríveis

Algumas tarefas eram inglórias
Tinham de descabeçar a previdência
Renegar o direito a renda
Financiar a guerra
Administrar a venda
Do pouco que os humanos ainda tinham

Os deuses querem ser donos dos destinos
Os deuses querem o poder do destruidor
Os videntes diziam apenas as verdades inventadas
E os oráculos ficavam cada vez mais poluídos com as constantes mentiras

Quando Sócrates se rebelou e renegou o poder dos deuses
Denununciou o poder do Olimpo
Foi morto e sacrificado
Através da histeria coletiva
Que os deuses incitaram nos humanos

E 2400 anos depois, ninguém mais conhece os deuses
Mas todos lembram de Sócrates
Os deuses foram mortos
Sócrates eternizado

No momento que o Olimpo domina a população
Os humanos têm de lembrar
Que apenas a eles, lhes foi dado o poder de decidir os destinos
E que apenas eles podem escolher pra quem entregar os destinos

Cortem-lhe a cabeça
Ponham uma cabeça de dinossauro
No lugar

sábado, 29 de dezembro de 2018

Círculos

Existem certos círculos que delimitam a realidade social. Os campos discutem, mas a ascensão da internet permite que outsiders tenham legitimidade pelo poder de influência. Essa é a própria discussão da democracia na política: será que apenas porque você convenceu mais pessoas a te escolher - depois de ser permitido pelas elites políticas -, você é de fato capaz e ético para liderar os interesses do conjunto de milhões de pessoas, os recursos de milhões de hectares de terra, os direitos e deveres?

A democracia não é um pacto que permite suicídio coletivo. Este blog sempre foi um espaço para a poesia, por que vejo muita beleza na arte da palavra, principal da palavra escrita. Mas os textos são apenas uma organização de símbolos que carregam significados sociais que são apropriados pelos indivíduos gerando sensações e sentidos internos. Assim, a própria existência destes símbolos organizados é a necessidade de existência do significado. Sem significado, eles não existem.

As pichações são indecifráveis pra quem pensa com a estética média e burguesa, mas as gangues as percebem de forma muito clara. Cada pichação é uma tentativa de deixar uma mensagem. Muitas vezes são: eu consegui chegar aqui.

Estes poemas giram em torno dos dilemas que eu sinto e vão significar apenas para os que sentem coisas parecidas. Muitas vezes passam pela negação de valores sociais hegemônicos, mas a estética é muito próxima da utilizada pelos mesmos valores. Isso demonstra de onde vim: uma estética burguesa e média. Por isso, é difícil que deixem de ser medíocres. Se um dia forem lugar comum para a sociedade é por que esta emissora foi colocada em posições de poder. (¡Oxalá não sejam comparados com os terríveis marimbondos de fogo!)

E girando em círculos, há mais de década estes escritos marcam e demarcam quem eu fui no tempo. Minhas consistências e metamorfoses. Nas entrelinhas, existe uma autobiografia poética.

Outsiders do mundo, destruí-vos. São apenas emanações dos erros humanos que foram filtrados pela ciência. Seu sucesso é mero acaso probabilístico.

A face do destruidor.

domingo, 14 de outubro de 2018

Onde

Pra onde ir?
Só há um lugar no mundo
O mundo
Fugir do mundo é fugir da existência humana
Cobrimos cada canto do planeta com nossa existência
Somos em toda a parte
Nunca seremos de todo

Todos os lugares são iguais
Alguns caixotes de cimento diferente de outros
Mas caixotes para macacos morarem dentro
Carregam água limpa, alimentos,
energias e outros fluidos

Eu sou uma caçadora
Em um lugar escondido
Uma caçadora em busca da caça

Eu sou a caça
Num lugar proibido
Uma caça em busca da caçadora

O duelo final é um só
Um dueto
Em todos os lugares do mundo
Do meu mundo
Da minha terra
Do meu ventre
Do meu ser
Que nutre a caça
E a caçadora que busca
Não se tornar presa

Presa dentro um corpo moribundo
De um planeta fúnebre
Em que o ódio instrumentaliza a violência
O medo rega a paranóia
De um corvo depenando uma coruja

Não existe lugar no mundo
Para onde se possa ir
Mais longe do que se está
Em si

terça-feira, 8 de maio de 2018

Uma ode à loucura

A loucura é boa
A loucura enlouquece e se torna sã
A vida gira, isso é loucura
Milhares de fios entrelaçados sem sentido algum
Isso é loucura

A sociedade alternativa? Loucura
A lei? Mais ainda
Estou louca é viver
Viva enlouqueço os outros

As formas desfiguradas tomam conta das ruas
As linhas retas são uma ilusão
O clássico é um mito

Loucura de blusão no sol
Loucura pipocando
Loucura pela pela rua

A morte é o fim da loucura
O fim da loucura é morte
Loucura por dentro
Loucura por fora
Loucura em flautas

segunda-feira, 8 de janeiro de 2018

Pop

Bolhas de sabão pelo ar
Crianças correm em minha volta
O sol ofusca minha visão
O vento alisa meu rosto

É tarde, tudo fora de compasso
Anoitece, o ritmo cresce
Pede o balanço e o passito
Carinho e charme a me esquentar

O sabor é doce
O resultado é o ritmo
O ritmo é me soltar

Você me segura no ar
Meu coração pára
POP, sinto estourar


Boas festas.

terça-feira, 24 de outubro de 2017

Rio

Mais um Silva me deu oi hoje na rua. Talvez tivesse comido. Não penso que dormiu, não parecia relaxado, era visível que ainda vivia o mesmo dia de ontem. O sinal fechou, meu olhar também. Prédios gigantes se amontoavam vazios, sumindo sem luz na noite escura. O morro se acendia como uma vela de oração.

Cabeças baixas não me percebiam enquanto dividíamos a mesma calçada. O vendedor na esquina me cumprimenta e me pergunta ser levarei o pão. Hoje não, não mesmo. Trabalho por honestidade, mas o salário não cai pela injusta falta dela. Mais de 500 anos pro Brasil descobrir Cabral e tudo o que nos levou.

Volto em Janeiro. O Rio não será o mesmo, conquanto eu também não o seja. Nas suas águas, abriu-se o mar vermelho e os escravos tentaram fugir quando já era tarde demais. Restou-lhes aguardar a terra prometida: uma cidade maravilhosa.

Será que o Maracanã durará mais do que o Coliseu? Nero sempre me deixa em dúvida. Um pedaço de mim aqui fica.

Uma pequena homenagem a Bob Rum.

sábado, 25 de março de 2017

Essencialmente

Existe alguma essência no que somos? Se existe, ela é material, ligada a nossos genes, nossa expressão deles, nas nossas características fenotípicas? Existe alguma essência em nosso psicológico, algo que nos constitua em nossas atitudes, nossas reações, nossas vontades, nosso imaginário, nosso raciocínio? Existe alguma essência por crescermos em algum lugar, termos certos tipos de pais, irmos a certos colégios e fazermos certos tipos de amigos e inimigos? Existe alguma essência na vida, que a separe do que não tem vida? Quer dizer, um corpo morto é tão inanimado quanto uma pedra ou as ondas do mar.

E se a essência não for importante, o que te constitui em algo individual, em algo único? Se não somos algo único, não temos qualquer importância. Ser algo único é ser carregado de significado. O significado pode ser interno, mas também pode ser socialmente atribuído. Uma relação simbiótica se constrói para o exercício do nosso significado. Nosso significado não existe se não pode ser exercido, como um corpo morto.

O sentido da vida é a busca do significado incessantemente, posto que quando cessa, cessa a vida também. Nossa essência não é imbuída de qualquer significado. Nossa gênese, nossa temporalidade, a efemeridade de nossos atos são parte do nosso veículo: o corpo. O corpo é o meio pelo qual se constitui a consciência e através dela o significado. Quando a consciência está confusa, é difícil ver o significado. Quando ela está ausente, não somos nem mesmo responsáveis pelos nossos atos. A busca da religião é a busca de um propósito. A busca de grupos identitários é a busca de um significado social.

Essencialmente, nascemos mortos e ao crescer, criamos a nossa vida. A senciência não é consciência. A consciência é capaz de distinguir e separar a nossa existência de outras. A consciência percebe a morte. A consciência apercebe a morte. A morte é de onde viemos e para onde vamos. A senciência é apenas um instrumento para verificar nossas vontades, as necessidades de um organismo vivo. É fundamental para a existência da consciência, sem sê-la de fato.

quarta-feira, 7 de dezembro de 2016

Campos de Morango

A consciência é o que define a nossa essência humana. É ir além do mundo ao redor ou do outro. É perceber a existência inexorável de ser. Não é possível não ser. Somos consciência, que está atrelada diretamente a um órgão, o cérebro.

Nossa existência está confinada ao nosso corpo. No entanto, a falência de diversos orgãos não caracteriza o fim humano. A falta de movimento nos membros, o descompasso dos rins, a cegueira, o coração descompassado. Tudo isso não impede a tua existência humana. O que impede é a falta de funcionamento do cérebro pra permitir uma consciência apurada.

Um cérebro que não esteja funcional impede a normalidade de nossa essência. Depressão, esquizofrenia, mania, ansiedade são doenças que produzem um sofrimento contínuo e de baixíssima intervenção.

A nossa existência efêmera sempre teve sentença de morte. Qual a diferença entre escolher a hora de morrer e morrer sem escolher? Nenhuma. Não existe nada depois da morte. Se todos estamos mortos, porque continuar esta batalha para continuar vivos?

terça-feira, 25 de outubro de 2016

Vem, vamos embora

"Vem, vambora
Entre por esta porta agora
E diga que me adora
Você tem meia-hora
Pra mudar a minha vida"

Eu sinto a tua falta
A tua falta em mim
O teu carinho
O teu calor

Eu sinto a tua falta
A falta de tu entrar pela porta dos meus olhos
E dizer:
VAMOS EMBORA

A tua atitude, o teu carisma
O teu jeito de me cativar
De me escolher

É clichê
Mas eu sinto teu cheiro no travesseiro
E me abraço nele

Tu tinha um jeito especial de me fazer sentir viva
E eu te escolhi por isso
Eu quero te ver de novo
Eu quero aquela mágica me enebriando

Vamos recomeçar?
Não quero perder meu tempo
Muito menos o teu
Eu quero sair
Não quero mais ficar aqui

Ficar em mim é insuportável
Eu preciso da tua atenção

O pranto me deixa a cara formingando
Essa sensação horrível
De o coração sair pela boca
E a cabeça fica zunindo
As mãos batem com força no peito
Eu não me sinto em mim

A sensação de não estar aqui é muito forte
A respiração ofegante é a única coisa que me prende
No aqui e no agora
Eu me sinto
Falta me sentir viva

Fim.

Viva Adriana Calcanhoto.

domingo, 4 de setembro de 2016

Buffet livre

É um pedaço em fogo
É politica que arde
É grito e sufoco
É pouco

Nada vai acontecer
Nada
Talvez mudem as estações
O salário continua sumindo
O escravo sofrendo

Vários mundos em um só
Vem se desfazendo
Até virar pó

Impedimento é um prato que se come frio
E essa terra esfriou há bastante tempo

sexta-feira, 5 de agosto de 2016

Não me deixe só

Não me deixe apenas comigo mesma
Eu sou minha pior inimiga
Me dá frio na barriga
Ficar só à mesa

Eu caminho sozinha no escuro
Não é possível ver nada
Só sinto a mim, no vácuo
Vazia e com a respiração ofegante

Penso que me movo
Mas estou no mesmo lugar
Perdida, cansada
Me canso de vagar

Meu pedido é simples
Não me deixe só
Eu sou um pesadelo
Você me leva pra um lugar melhor

Não nos deixe só
O mundo será sempre pior
Sem a tua voz
Teu odor
Teu carinho
Nosso amor

A solidão existe
Na morte, no espaço
Na minha cabeça e no meu abraço
A solidão
E só

terça-feira, 3 de maio de 2016

Sem espaço

Um mundo pequeno, infinitamente pequeno, tomou conta de mim. Um ponto no espaço revela exatamente que eu não tenho espaço. O ponto se repete, se ilumina e se apaga todas as vezes que algum dos seres nascem e morrem. O ponto não é. E não somos nós, mais do que um ponto. Um ponto em movimento no espaço imenso, nos despedaçando em uma quantidade ínfima de tempo.

Sentir é uma ilusão. Nada pode completar algo tão pequeno. Nada pode ser onde nada pode estar. Hoje, um ponto, uma luz. Amanhã, sem ponto, sem luz.

E na imensidão do espaço-tempo, os pontos se unem e se separam numa dança de um tempo inobservável. Tantos pontos quanto se possa imaginar. A consciência acessa o ponto, o ponto deixa de ser objetivo e passa a ser subjetivo. No entanto, um ponto observado, é uma realidade dentre as muitas que ele pode ou não ser.

O ponto se esvai no caos da cidade, na babel da internet. O ponto que eu sou, o ponto sou eu. O ponto, na ponta. O ponto apontando. O ponto sem eu. O não-ponto.

sexta-feira, 26 de fevereiro de 2016

Tecnologia

Pedras, lascas, varetas de fogo
As pessoas polidas sempre assassinas
Plantações, currais, aquedutos
Ferro, bronze e guerras bonitas

Sanguinários, os olhos vermelhos enchem os campos
De batalha, se fundem os corações e os leões
Da morte, vivem os moribundos e os anjos
Do forte, choram os pobres e os vilões

Os tiros, as bombas, o calor dos infernos
A fome, de perto, os urubus, de longe
Despedaçam minha consciência a cada clique

Para o sofrimento dos outros
Na guerra é a gente que cria,
Por necessidade, a tecnologia

segunda-feira, 28 de dezembro de 2015

Plural ou nada

Tem gente que diz que a melhor defesa é um bom ataque. Tem gente que diz que o melhor ataque é uma boa defesa.

Dissolver o ego não é perder a própria identidade. Nossa existência num corpo, muitas existências num corpo. Até hoje só pudemos descobrir a existência a partir da noção de consciência. A consciência da existência nos faz perceber não apenas os outros, mas a nós.

Pequenos fragmentos de mim. Vários eus num mesmo corpo, sem controle um sobre o outro. Quando brigam entre si, nós choramos. Um pedaço cai, outro também. Até que não sobra nenhum e eu fico apática. Cheia de energia, inventiva, lógica, ambiciosa, pessimista, deprimida, suicida, dona do mundo.

O melhor de mim e o pior de mim, em mim. Perder o controle é tão fácil.

quarta-feira, 25 de novembro de 2015

Meu amigo secreto

- Deixa estar. Disse ela, sem convicção.

A tragédia já estava pronta, não havia plano B. Era só esperar acontecer. Olhava pro mar procurando um último suspiro de vida. Um urubu procurava peixes mortos entre o lixo acumulado na margem da praia. Um vento triste sopra em seus ouvidos. A morte se anunciava nos jornais como um acontecimento da natureza, no entanto, ela sabia que não era assim.

Caipora estava ocupada tentando proteger outros seres na floresta. Os homens já não estavam por perto. Oxum chorava triste à margem do rio, sentia como se tivessem matado mais uma parte de si. Mais triste ficava por não ter sequer uma lágrima doce. Tentava avisar Iemanjá, mas já era tarde, só podia esperar acontecer. Não existe oferenda que resolva quando se ataca um orixá assim. De um lado ao outro do oceano, quem passa pelo bojador gera cada vez mais dor. Iara, por que não vem buscá-los? Xangô, anuncia tua justiça! Da tua pedreira construiram a destruição, a nós resta a rendição?

O mar azul hoje é um mar vermelho. Um rio morto! Pavimentado. Sem vida, sem ar, sem paz. A guerra foi declarada contra todos os seres. O karma vem e vai alimentado pelas ondas do samsara. A velhice e a doença atormentando a todos. Como é possível olhar para isto, se sentir responsável e não fazer nada?

Ela continuava imóvel assistindo a tudo com o coração parado. Olhos e ouvidos fechados, tentando não sentir o mundo. O mundo era ela mesma. O mundo que ela não fez, mas que dela fazia morte.

Cadáver sobre cadáver. Morrem todos, morre tudo, morre quem mereceu e quem não merecia. Morrem na guerra e na paz, com mais sofrimento na guerra. A morte não alivia.

quarta-feira, 11 de novembro de 2015

Pequeno

O pequeno
Piccolo momento
Niños y niñas
Un bâton

O chão gira
O pão cresce
A água desce
O fogo, pira
O vento mexe

Aqui dentro
Só, pequeno
Grande vai saindo

sexta-feira, 16 de outubro de 2015

Estou orgulhosa de mim

Estou calma. Estou em paz. No meu mundo interno, cessou a tormenta. Eu vejo o passado, vejo o presente. Não é sobre onde eu cheguei. É sobre quem eu me tornei. Eu me vejo em mim. Funcional, bonita, normal. Cheguei ao bojador. O sofrimento é um sentimento distante, inconstante, vazio.

Se sinto dor? Sim! Estou viva! Cada pedaço real de mim é um pedaço na minha consciência. Ter adequado a realidade não me trouxe a fórmula da felicidade. No entanto, me alinho comigo mesma. Não grito mais pela dor lancinante que emanava de um pedaço para todos os outros pedindo para desligar a vida. Nem mesmo a sinto. Me sinto bem, é como se após limpar a casa e trocar alguns móveis, minha casa voltasse a ser cômoda, confortável e sadia. Uma casa agradável não é a fórmula da felicidade, mas pode te permitir viver melhor e com menos preocupações.

Tenho orgulho de mim. Vim, vivi e venci. Anos para entender afinal o que acontecia comigo - e ainda restam outras coisas a entender - e poder ir atrás do que me faz bem. Eu me sinto bem por ter seguido o caminho, mesmo que me afligissem o medo, as distrações, as confusões, muitas vezes sozinha. Eu trilhei o caminho e construí a minha estrada. Tenho orgulho de ter caído tantas vezes, achando que ficaria no chão para sempre, e ter me levando, limpado as lágrimas e seguido em frente.

Eu sou quem eu sou. Sou quem eu fiz de mim. Agradeço a todos pelas contribuições e não me ressinto de todos que trouxeram obstáculos. Todos vocês são parte do caminho. E o que deixaram comigo é parte de mim.

domingo, 4 de outubro de 2015

I have a feeling

And there I was, looking to the traffic through the window. It's the same feeling always: emptiness. There is no meaning in anything. Like your life is always a heavy stone to others to carry that is a threat to other people's life. So, why should I continue? There is no reason to feel like this way forever. If you doesn't help, just don't mess up.

And there was the raining. And a bird, so many birds flying around. There is changing in everything. Our nature is impermanence. So is mine. Then, I felt complete. Complete, cause nothing can complete me, and I was full of nothing.

And there was traffic jam, people overreacting about losing a time they would only turn off. They cannot feel what is inside them and became angry. They cannot even fell themselves, how could they fell the others? Some says that our culture is selfish. I don't have the same view. Cause people do not fell their selfes! They don't control their emotions, fellings, thoughts, speeches and actions. There is nothing selfish in consumism, it's just a way to fill up our emptyness.

Look for what differs you from anothers? Nothing. You are the same. We are the same. We are all looking for happiness and avoiding suffering. Why to continue suffering? Life is only a thing that our minds can know by our brain. Our highly evolutioned brain. It only exists in our body, in our perception of the world.

So here I am, rocking myself up to the mountain, like Sisifo. Every day is another to keep pushing myself up from the down of the mountain. God, I wish I could change the mountain! God, I wish I could change me! Me and the mountain are the same, and so are you.

Can you feel it? I do.

"I only know that I know nothing, and this make aware to look for wisdom and knowledge." (Adapted from Socrates speech attributed by Plato).

segunda-feira, 17 de agosto de 2015

Quem é você?

Quem é o trabalhador? Quem é você?
Quem é do povo negro? Quem é você?
Quem manda no Estado? Quem manda em você?
Quem casa legalmente? Quem pode expressar afeto por você?
Quem existe pra este mundo? Onde está você?

Nos defendemos tanto sem saber
Quem de fato pode nos atacar
Na selva de pedra, todo dia é uma batalha
Só a morte é o fim da guerra

Quem sofre por seu gênero? Quem faz você sofrer?
Quem não pode acessar a sociedade por conta de sua deficiência? O que faz você?
Quem é internado por tentativa de suicídio? Quem cuida de você?
Quem é você? Será que sabe ler? Conhece algum analfabeto funcional?

Nos defendemos tanto sem saber
Quem de fato pode nos atacar
Na selva de pedra, todo dia é uma batalha
Só a morte é o fim da guerra

Vergonha, auto-humilhação, auto-mutilação
Definhando por não comer ao ver um corpo dismófico? Quem é você?
Falsa humildade, vaidade, brinca com as necessidades alheias
Quem é você? Você atravessaria o mundo pra alterar o que a natureza fez de você?

Nos atacamos tanto sem saber
Por que é necessário matar?
Homem-primata, destruição tecnológica
Mata árvore, mata boi, mata Atlântica
Mata o outro sem nem olhar pro lado
O próximo é você?
Pelo bolso, mata povos inteiros
Só falta querer fazer o mesmo no céu

Quem compra sua comida? Quem a planta pra você?
Bebida suja na natureza limpa, melhor açúcar e sal com gás
Você tem sede de quê? Você bebe o sangue de quem?
Quem se diverte por termos diferenças?
Qual a arte de rir de quem está marginalizado?

Nos defendemos tanto sem saber que já sabemos...

Legião e Titãs

quarta-feira, 12 de agosto de 2015

Matemática

Todos somos produtos
A ordem dos produtos não altera o resultado
A soma de todos é 1
Não cabe diminuir, menosprezar
Toda vida é sagrada
Dividir para conquistar?
Unir para completar!

O mundo natural, amoral
Nos mostra apenas o que é real
O racional que nos guia aos imaginários
Mostra como somos complexos
E como por eles nos tornamos irracionais por inteiro

O ábaco dos anos não é programado
Tal qual um relógio de areia
A teia do tempo se curva no espaço
E tudo o que sabemos se torna irrelevante
Vazio como um instante fora do universo
O tempo é o mais sagrado deus humano

Operando a vida, o médico entra em ação
Suas mãos robóticas e o ambiente esterilizado
O fôlego paralisando, escuridão...
Nada se cria, nada se perde, tudo se transforma
Um papel e uma cirurgia me renovam
A morte e a vida em uma superposição de estados
A incompreensão dos outros é tão forte
Quanto a metáfora do gato quântico

Sigo sendo eu mesma integralmente
Infinitesimal nesse mundo contínuo
Me encontrar pelo caminho
Sem atalhos, sem derivar por outros caminhos
Sei que vou encontrar resistências
Vou ser induzida a comportamentos negativos
Mas sei também que sou capaz de poder ajudar todos os seres
A se sentirem e a serem mais positivos

A ciência e a arte me emocionam
Ondas que reverberam por todas as selvas
Me enchem os ouvidos de felicidade
O canto que vem das pedras
Ou da existência pacífica dos outros ambientes
A luz que me ilumina, faça lua ou faça sol
Os gostos e cheiros que se espalham dentro do meu corpo
Em cada fase da vida
Mexem com frequência no meu coração

Força, vai dar tudo certo
Basta um impulso para acelerar
Depois disso basta ser constante
O que está em movimento continuará no movimento
Internamente, gira a bússola
É hora de me mudar

A equação da vida
É um eterno caminhar

terça-feira, 14 de julho de 2015

Oito meses

Os dias passam devagar
As paredes e o teto me confundem mudando de cor
Cada tom varia durante o dia
O sol e as lâmpadas compõem uma música lenta e melancólica

De repente, não há portas ou janelas
O mundo gira dentro da minha cabeça e não há escapatória
Como numa máquina de lavar
Meus pensamentos ficam imersos, são sacodidos, e se debatem dentro de mim
A vontade de desligar da tomada é enorme, mas tenho uma conexão mais forte
Mesmo que a vida não tenha nenhum sentido, mesmo que tudo o que a gente faça fique num passado esquecido
A sepultura ainda não é lugar pra mim
Não é lugar pro meu amor ou pra minha compaixão

Um amor correspondido é como a mesma vida em duas pessoas
Meu amor e minha vida, agora no mesmo lugar
Oito meses, oito anos, oito séculos
Vai ser eterno enquanto carregarem nossa existência
Mas que existam tantos outros amores por aí para nos diluir e um dia deixar nossos laços em paz

A completude existe na vacuidade de não sermos dois
A vida, nem cansada, nem repetida, vai nos carregando pra novos destinos

O tempo vai passando
Não sei mais onde estão as paredes e a chuva me molha friamente
O vento e o temporal compõem um lindo quadro na minha janela
A porta se abre
Ele chegou

domingo, 5 de julho de 2015

Sinto

Sinto meus pés a cada passo
Sinto meu coração acelerado
Sinto uma música no meu viver
Vivo a sensação de assim me ser

Danço como gira o mundo
Me abro como as asas de um pássaro
Pinto de rosa minha felicidade
Saia é a minha intimidade

Recomeço tudo e vago
Com os pés no chão do amor
E a mente num estado libertador

Sou nova e sempre a mesma
Sou amada, porque me quero bem
Sou eu, nunca me senti tão eu antes

Obs.: Sentire significa tanto sentir quanto escutar em italiano.

sexta-feira, 19 de junho de 2015

Libertador

Libertador é a faca na mão certa
Libertador é me livrar de um apêndice maldito
Libertador é poder viver meu corpo conforme minha cabeça
Libertador, ser quem eu sempre fui

Como pude me enganar por tanto tempo?
Como pude negar meus sentimentos mais íntimos?
Negando a mim mesma, cheguei perto da morte
Negar quem se é, é morrer cada dia

Libertador, viver do lado do meu amor
Poder beijar, abraçar, amar
Viver a vida com todo meu ardor

Em breve,
Quando tudo isso acontecer,
Estarei liberta da dor

domingo, 24 de maio de 2015

Não pertenço

Eu não pertenço. Eu vim até aqui pra desistir agora. Não pertenço a aqui, nem ao meu corpo. Não pertenço a este tempo. Eu não pertenço a este sofrimento. Nem a estes conceitos.

Não, eu não vim até aqui pra desistir agora. Eu ainda tenho um amor que me deixa viva. É um amor por mim, que me faz temer toda vez em que penso na minha morte. Eu sou idiota o suficiente pra acabar comigo. Mas não fiz isso porque ainda me amo. E tenho a pessoa mais querida e fofa do mundo pra me lembrar disto. Que além de mim, tem mais pessoas que querem o meu bem. Que ele me ama muito e é capaz de passar por grandes provações e ainda assim me amar. Que tenho amigos lindos que me amam e que eu amo também. É pra me lembrar que depois de eu sentir tanta mágoa e abandono, meus antigos amigos ainda lembram de mim. Que gostam de mim, mesmo que o convívio tenha acabado. Isso é muito gratificante.

Sim, eu tenho um irmão maravilhoso que ainda me ama. É meio esquecido e tá sempre na correria (:p) mas tá guardado no meu coração. Que eu tenho pais que me amam muito mas que ainda carregam um certo orgulho e valores que nos afastam. É, eu amo eles e sinto muita falta, mas não posso mais dizer isto pra eles. Espero que um dia a gente possa se reencontrar.

Afinal, está é uma longa jornada até my self. E tem tanta lembrança boa no caminho. Tantos momentos bons. E o apego traz tanta dor. Aos poucos e periodicamente, eu me lembro de que tem horas em que é necessário deixar as coisas pra trás. Maria Gadú canta: "o apego não quer ir embora, diacho, ele tem de querer". Mas sabe, quem tem de deixar o apego ir embora é a gente.

Tantas experiências, conheci tantas pessoas fantásticas. Vivi uma vida que poucas pessoas tem orgulho de poder contar. Eu cheguei lá. Eu vi tudo isso. Eu vivi tudo isso. Não há nada que pague isso. Se me perguntassem se eu gostaria de voltar no tempo, eu certamente diria não. Não me arrependo do que fiz. Queria evitar o que alguns fizeram comigo, mas isso me tornaria menos eu.

Chega uma hora na vida em que se tem de admitir que se errou. Afinal, a natureza humana é a prática do erro. Você pode acertar muitas vezes. Quem você é é o que e porque você errou. Afinal, pode-se errar muitas vezes. Mas você deve saber a hora de não insistir mais no erro. Faça isso. Saiba quando é hora de abandonar velhos conceitos, velhos laços, velhos materiais. E isso não é uma ode ao novo. Afinal, nada disso é novo. Mas se você quer de fato melhorar e encontrar um caminho melhor, não insista nos seus erros e se desfaça das coisas que te prendem a eles.

Sinto que talvez seja a hora de partir. Foi uma experiência fantástica. Uma das mais fortes jornadas de autoconhecimento. Me conhecer é parte importante do processo, sempre foi. Aceitar meus gostos e minhas vontades. Aceitar meus impedimentos e minhas dificuldades. Saber perceber os momentos de falha e melhorar. Buscar ajuda não é vergonha. Ou você existe sozinhe no mundo?

Hoje, eu fui confundida com o meu estereótipo. Sem personalidade, apenas identidade. Eu cansei de identidade. Eu nunca me senti como os outros. Eu nunca fui parte dos outros. Eu conhecia alguns dos meus gostos e fui me juntando às pessoas. E quanto mais conhecia essas pessoas, mais conhecia meus gostos. Cada pedaço de mim foi um caminho percorrido. É eu já corri meio mundo. Um ponto importante é não se negar às oportunidades. Viva e busque vida.

Claro, faça as coisas com destreza e não se permita ficar muito vulnerável. Conheça seus pontos fortes e suas fraquezas. Não deixe um rótulo dizer quem você é. Não deixe a sua identidade negar a sua personalidade. Estude. Realmente se dedique a isso, por mais penoso que seja. E nunca se esqueça: questione. O único limite pra perguntas é o seu raciocínio. Use o seu raciocínio. Não acredite nas coisas porque alguém te disse que era assim. Veja por si mesme. Se jogue nos mares da vida, mesmo quando parecer um precipício. É normalmente profundo o suficiente pra você não se arrebentar. Mas também saiba pular. Não jogue todas as suas forças contra a correnteza. Construa espaços e não tenha medo de entrar e sair dos lugares. Meus pais me ensinaram: Mantenha o respeito e a educação e tu vai poder conversar com o presidente. O mesmo vale para aquela pessoa que te abordar na rua. Se a violência toma conta dos outros, não deixe que ela tome conta de si.

Algumas pessoas podem achar que eu mudei. Mas sabe, tenho amigos de desde meus doze anos(vocês sabem quem são, vocês me conhecem a mais de metade da minha vida) que já me disseram que eu sou a mesma pessoa. O que eu posso concluir é que meus gostos e até mesmo minha identidade não controlam minha personalidade. E todas estas jornadas foram me mostrando quem eu sou. Porque eu continuei a mesma, apesar de diferente.

Gatos podem ter sete vidas, mas podem viver a mesma vida várias vezes? As dificuldades mudam. O mundo muda. Você muda? Você sabe quem é? Você conhece suas emoções intimamente?

Afinal, a dor que se carrega é a mesma delícia de ser quem se é. E eu sou. Eu sou eu mesma. Eu sou um marco neste mundo. MEU mundo. Venho cada vez mais me permitindo sentir e abraçar meu eu. E sentir dor toda hora que meu eu sente dor. E me sentir alegre quando meu eu se sente alegre. Não pense que eu sou diferente do meu eu. A melhor símile é com a santíssima Trindade. O mesmo ente é ao mesmo tempo três. Eu sou eu, meu eu, meu centro e minhas periferias. Cada reação que eu sinto é eu. Eu, em cada pedaço do que faço, mais eu em cada pedaço do que sinto vontade. Eu em cada amigo e eu em cada rancor que se mantém em mim e tento dissipar. É provável que eu seja o eu certo agora, mas na hora e no lugar errados.

É hora de começar a construir outra partida para na hora certa poder zarpar. O próximo porto? Onde estiver meu coração, lá estarei. Saber onde estou eu é pedaço de poder construir um eu com uma pessoa maravilhosa, que possui um eu incrível. Dois corações juntos sentem melhor do que um.

quinta-feira, 21 de maio de 2015

DisSolução

Meu corpo, um simulacro. Uma vontade vazia perdida no espaço-tempo. Sou apenas uma imaginação sem vida real. É quase como ser o contrário de um robô. Um robô tem vida e interage com o mundo e as pessoas, mas não tem essência. Eu sou um fantasma, possuo essência mas não existo em lugar algum.

Imagine gastar o dinheiro de uma casa pra poder viver na sua principal casa, o seu corpo? E ainda ser considerada uma mentira, uma farsa. É quase como um ser um andróide moderno, regulado por compostos artificiais. Com essa experiência, tive de deixar de dar valor ao natural. E assim, o mundo vai se tornando artificial, as sensações vão se tornando artificiais. A busca mais antiga da filosofia, a descoberta do "eu", que é fundamento essencial para entender o que é a consciência me martela dia-a-dia. Afinal, eu simplesmente deixei de viver num mundo de verdades.

O ceticismo tomou conta de mim. Nada é verdade se não apresentar elementos de correlação, se não apresente os elementos de causação. Nada é verdade se não tiver prova, nem se não houverem experiências que podem ser verificadas. É quase um negacionismo Descartiano, sem "penso, logo existo". Existir depende de diversas condições. Primeiro, é necessário ter um corpo físico. Depois é necessário que esse corpo permita tu te comunicares com outros seres. Ainda, é necessário que os outros seres reconheçam o que é a tua existência.

E quando o ceticismo nega tudo, até mesmo a tua própria existência? O que sentir? Como sentir? A única coisa que não há é a negação da negação. É possível algo que não existe poder tomar uma ação como negar? Nego, logo existo? Não.

Bem, de fato, meu corpo não existe. Não reflete o mínimo do que eu significo. Assim, não estou cada dia mais perto da morte, mas da expiação. E isso não me alegra. Apenas pessoas vivas e que existem podem sentir alegria. E eu não vivo nem existo.

Esperança? Pff. Mentiras podem ser confortáveis, mas nunca trarão algo real. Sou uma mentira no mundo das verdades. Me dissolvo no mundo até não significar mais nada. Sou nada e nada existe. A solução é não haver solução. Nada é solução. Nem a busca pela vida, nem a morte definitiva.

domingo, 26 de abril de 2015

Dê uma chance à paz

O dia é hoje. Hoje é sempre um bom dia, pois não temos outro dia. Nunca esqueça que outro dia ainda não é um dia que está com você. Hoje, dê uma chance à paz. Perceba em seu coração como a natureza humana te permite pensar em si carinhosamente. Cuide de si. Cuide da sua saúde, cuide dos seus conhecimentos, cuide das suas emoções. Não deixe que que a raiva te consuma, não deixe que a dor se espalhe. Também não deixe o orgulho te impedir de pedir ajuda. Não deixe o apego estagnar você. Não deixe o desejo dominar você.

Perceba em seu coração como a natureza humana te permite pensar em todos os outros seres carinhosamente. O acaso te colocou neste corpo, mas o que te difer dos seres em outros corpos? Esses outros seres também seguem o caminho do samsara: nascimento, envelhecimento, doença e morte. Todos os seres vão passar por momentos de sofrimento, porque aumentar isto? O quão possível é para você ter compaixão por estes seres? As diferenças são meras ilusões. Se humanos possuem tons de pele diferentes ou desenvolvem genitais diferentes ou possuem uma incapacidade física ou mental de desenvolver certas ações ou se tivessem mais ou menos posses ou estivessem em maiores ou nulas posições de poder, o que as torna melhores ou piores? Por que segregar as pessoas, xingar-lhes ou agredi-las? Pense, o acaso poderia ter te botado na posição desta pessoa nesta vida.

Hoje, torne sua fala menos agressiva. Tome atitudes que não machuquem as pessoas. Pense constantemente em como coisas positivas podem ser feitas para si e para as pessoas. Pense em como a raiva só te gera sofrimento e dor.

Esqueça o desejo. Esqueça tudo o que você quer. As coisas são mera ilusão. Você sabe o que é importante para viver. Não se apegue. Tudo neste mundo é absolutamente impermanente. Seu prato de comida, suas roupas, seu corpo. Tudo vai tomar outra forma e outro sentido neste mundo. Mas se tudo é impermanente, por que não agir inconsequentemente? Ora, todas as ações tem suas consequências. Se o sofrimento é impermanente, por que se preocupar com o sofrimento dos outros seres?

Afinal, qual ser gosta do sofrimento? É comum tomarmos o sofrimento como uma punição, uma resposta a algo que fizemos em outras épocas. Mas o sofrimento é mera manifestação obrigatória da vida. Hoje, você é agente ativo e tem pleno poder de inflingir sofrimento ou compaixão aos seres.

Hoje, dê uma chance a paz. Acalme seu coração. Seja capaz de perceber o quanto vida é preciosa e como todos os momentos são importantes. Verifique cada passo seu. Veja se ele foi em direção a compaixão. Faça o possível para pacificamente impedir que a dualidade te distancie dos outros seres. Ao mesmo tempo, não esqueça que esta oportunidade incrível de ter habilidades de discernimento e de poder de decisão e ação humanas te garantem um potencial imenso de perceber as características dos seres. Uns seres serão capazes de enormes façanhas, como correr longas distâncias ou descrever abstratamente o funcionamento das leis da natureza. Ame-os. Outros seres serão incapazes de perceber tais feitos, outros também não estão aptos a atingir tais feitos. Ame-os. Alguns seres estarão tão distantes neste mundo que você nunca os conhecerá. Ame-os. Outros seres viverão de causar sofrimento e morte. Ame-os. Ame a si, procure impedir que o sofrimento te domine. Ame aos outros, impeça o nascimento do sofrimento.

Pense em quantas condições foram necessárias para você ter a oportunidade única de poder fazer seres felizes. Da existência dos sistema solar, à camada de ozônio, bilhões de anos de evolução. Seja sujeito de si, seja sujeito de direitos. O trabalho de quantas vidas se fortificou e permitiu que você chegasse nessa geração vivo, com acesso à medicina, às benesses do trabalho das forças inorgânicas da natureza, à capacidade de comunicação e de ajuda mútua.

É difícil com toda a ética da vida moderna ocidental não se individualizar. Somos meros instrumentos de consumo, somos meros instrumentos de produção. Um ciclo vazio de sentido nos amarga a cada nova compra supérflua. O café que você toma pode vir de plantações em que o trabalho humano é subjulgado e as pessoas não conseguem mínimas condições de sobreviver. Ame-as. Procure formas de impedir que este ciclo continue. A roupa que você usa, o celular para se comunicar, vem de onde? O funcionamento da divisão internacional do trabalho se baseia em resquícios colonialistas e imperialistas. O sistema vende sofrimento. Procure formas de impedir este processo.

A divisão de países, as classes sociais, as distinções de gênero, as disputas étnicas, a criação de um sistema que não permite o acesso à sociedade de pessoas com alguma dificuldade ou impedimento motor ou de adaptação mental. A fixação de padrões de beleza, a pressão por um corpo ideal. Cárceres psiquiátricos, cárceres prisionais. Bairros para pessoas com propriedades, bairros para pessoas sem propriedades. Trabalho para pessoas com propriedade, trabalho para pessoas sem propriedade. As fronteiras são meras imaginações para separar as pessoas. As propriedades são meras imaginações para separar as pessoas.

Então, hoje, dê uma chance à paz. Esqueça as divisões, esqueça as dualidades. Não esqueça que devemos lidar com a realidade das diferenças. Não esqueça de lidar carinhosamente com os outros seres. Evite a morte e o sofrimento aos outros seres assim como evita a morte o sofrimento a si mesmo.

Hoje, dê uma chance à paz!

sexta-feira, 10 de abril de 2015

Escreva-me

Amanhã ou depois, escreva-me
Quando o dia parecer cinza
E o sol não brilhar na janela do teu quarto
Ainda, escreva-me

E se não tiver nada a dizer, ainda assim, escreva-me
Eu posso entender perfeitamente este vazio que te acompanha
Eu posso entender essa solidão, pedaço do mundo
Que se faz tão presente nas nossas vidas

Escreva-me, quando o coração estiver batendo forte
E a saudade não te deixar pensar em mais nada
Escreva-me, porque os nossos braços podem estar distantes
Mas os nossos corações estão tão próximos

Escreve em mim as páginas da nossa vida
E eu escrevo em ti todo o amor que eu sei dar

Pra pessoa com o coração mais lindo que tive a honra de conhecer. Estar contigo é um presente que os caminhos da vida me deram. Fer, eu te amo muito.