sábado, 25 de março de 2017

Essencialmente

Existe alguma essência no que somos? Se existe, ela é material, ligada a nossos genes, nossa expressão deles, nas nossas características fenotípicas? Existe alguma essência em nosso psicológico, algo que nos constitua em nossas atitudes, nossas reações, nossas vontades, nosso imaginário, nosso raciocínio? Existe alguma essência por crescermos em algum lugar, termos certos tipos de pais, irmos a certos colégios e fazermos certos tipos de amigos e inimigos? Existe alguma essência na vida, que a separe do que não tem vida? Quer dizer, um corpo morto é tão inanimado quanto uma pedra ou as ondas do mar.

E se a essência não for importante, o que te constitui em algo individual, em algo único? Se não somos algo único, não temos qualquer importância. Ser algo único é ser carregado de significado. O significado pode ser interno, mas também pode ser socialmente atribuído. Uma relação simbiótica se constrói para o exercício do nosso significado. Nosso significado não existe se não pode ser exercido, como um corpo morto.

O sentido da vida é a busca do significado incessantemente, posto que quando cessa, cessa a vida também. Nossa essência não é imbuída de qualquer significado. Nossa gênese, nossa temporalidade, a efemeridade de nossos atos são parte do nosso veículo: o corpo. O corpo é o meio pelo qual se constitui a consciência e através dela o significado. Quando a consciência está confusa, é difícil ver o significado. Quando ela está ausente, não somos nem mesmo responsáveis pelos nossos atos. A busca da religião é a busca de um propósito. A busca de grupos identitários é a busca de um significado social.

Essencialmente, nascemos mortos e ao crescer, criamos a nossa vida. A senciência não é consciência. A consciência é capaz de distinguir e separar a nossa existência de outras. A consciência percebe a morte. A consciência apercebe a morte. A morte é de onde viemos e para onde vamos. A senciência é apenas um instrumento para verificar nossas vontades, as necessidades de um organismo vivo. É fundamental para a existência da consciência, sem sê-la de fato.