sábado, 29 de junho de 2019

Preciso de um tempo

As coisas só são quando são. Só podem existir em um momento no tempo. E por isso, só existem fotos. A vida é um filme de rolo. Uma passagem de fotos em sequência. E só existe uma sequência. As outras sequências, ignoramos.

As coisas necessitam ser no tempo. E por isso, só são precisas no tempo. As coisas em mais de um tempo são como um borrão, quando se tira uma foto de algo em movimento.

Quando pensamos em pessoas, pensamos num ente, que se desenvolve, mas é sempre o mesmo ente. É o mesmo ente porque necessariamente carrega a própria história, sua sequência. Mas isto é a única coisa que o ente carrega entre dois tempos.

Por isso, quando olhamos pra uma pessoa e dizemos: ¡nossa, quanto tempo! Não estamos falando pra pessoa que já conhecíamos, mas pra pessoa que agora está. Quando escutamos sobre uma pessoa histórica, temos de entender quando ela é. Afinal, como Arnaldo Antunes ensina em sua música:
"todo mundo teve infância
Maomé já foi criança
Arquimedes, Buda, Galileu
e também você e eu"

Se você pensa que sabe com quem está falando porque conhece seu passado, não percebe o quanto pode ter mudado. E você também.

domingo, 2 de junho de 2019

Desordem

Tu acredita que existe alguma ordem ou sentido que governa a existência e o devir das coisas, ou que há simplesmente uma deriva, o acaso e o caos que explicam os acontecimentos mais naturais?

E se as coisas apenas existirem? Se não houver qualquer sentido para tudo existir? Apenas aconteceu. O que aconteceu e como aconteceu e é o limite do nosso conhecimento. Afinal, qual o limite da razão de um cérebro de 80 bilhões de células? E do conjunto de mais de 7 bilhões de cérebros de mesmo tipo? É interessante como ter 80 bilhões de células no cérebro não explica a sua natureza. O cérebro, um dos acasos mais impressionantes da natureza não apenas é o que o compõe. A natureza das partículas subatômicas não é suficiente para entender o gosto da água.

Por indução, nem sempre a soma das partes garante todas as propriedades do todo. O todo pode ser algo que excede o sentido do que o compõe. Assim vão se abrindo os fractais do caos que é a natureza.

O mundo não é racional. Não sou descartiana. Não duvido dos sentidos, não concluo que o ser perfeito existe. Imaginar a perfeição e o ser perfeito só demostra o limite da nossa razão, que supõe conceber a perfeição. Sou uma intelectual. Uma cética. Sou atéia. Mas não é possível ser cética o tempo todo.

Só que este lado da linha é vazio. Vazio de sentidos e razões. É como se tivéssemos que criar o sentido a todo o momento, e isso é pesado. É dolorido. Cansa. A sociedade cria os sentidos para manter a coesão, e liberta o pensamento para outras buscas. As pessoas comungam razões e isso é o que garante a coesão das tribos. Não ver sentido é não conseguir criar laços. É ver os laços e não se sentir parte deles. Negar o motivo pode gerar exclusão social. As pessoas que negam os princípios que as sociedades criam são marginalizadas.

Disso, a única coisa que pode salvar é relação da minha consicência com meus sentidos. Preciso mais do que acreditar no que me dizem os sentidos. Preciso senti-los. Preciso deixar a mente sentir. Porque o mundo não é racional. E a mim, na arte, o que não é racional, por vezes, me encanta. O humor que me emociona é o absurdo. É ácido. O lugar comum me cansa. Talvez haja algo de positivo em não fixar os laços. Mesmo com todas estas condições, com frequência encontro pessoas com quem faço laços. Mais do que isso, com quem tenho interesse em fazer laços. Pessoas com quem eu mantenho meus laços.

Preciso de arte para viver. O sentido que podemos criar para nossas vidas é a arte, pois a arte é sentir.


Disclaimer: Esse é apenas um esboço incompleto e desordenado. Como os limites da razão humana.