domingo, 14 de agosto de 2022

Navegar

O porto é um espaço feito de água e terra. Eu, marinheira, pelas águas a vagar, tanto mar, tanto mar. No meu navio, cada peça nova é comemorada. A renovação é sempre um avançar, é ressignificar. O passado e o presente no mesmo espaço, feito de afetividade e memória. Sou tão bem recebida no teu porto que nem dá vontade de partir. Não sou pirata ou mercante. Sou uma tripulante, o barco não é um meio, mas um fim. Todo sábado, aporto de bons ventos. Poesia e desejo. Viver e descansar. Filosofar e amar.
 
O tripulante é o mar. O mar é o tripulante. Mar calmo é viagem segura. Tripulante agitado é navio a balançar. Às vezes enjôo, às vezes me queimo do duplo sol que me ilumina. Às vezes me emociono, às vezes me somo. Teu porto é guarnição, aconchego, calor e qualidade. Meu coração ligeiro, cheio de sal, te vê pela costa, pela curva e se aproxima da tua areia. Deita e rola como se em casa estivesse. Cada concha encontrada é mais uma noite bem vivida.
 
Vem, vambora. A hora de partir é sempre saudade. Afetividade e memória. Construção e afeição. O vento leva e me afasta. Vento circular, coriólis que nos une. Se apenas o fim do mundo é triste, chorar me submerge, abraçar em ti é desafogar. Maré me embala. Maresia, teu cheiro me envolve, me devolve, me revolve. E sou feliz assim. No presente. Amar o mar é marinheirar.

Adriana Calcanhotto é uma marinheira. Eu sou mar. Maré, ah, mari...

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